Peregrino ou turista?

Ricardo Barbosa
5/9/2018
Hermenêutica

Jesus, por duas vezes, afirma na oração sacerdotal em João 17 que “eles (nós) não são do mundo.” O que Jesus quis dizer ao fazer esta afirmação? Ele ora para que sejamos enviados ao mundo, o mesmo mundo que ele também havia sido enviado pelo Pai. Ora também para que sejamos guardados do maligno. Porém, ele insiste em afirmar que, como ele não é do mundo, nós também não somos. Sem um sentido de transcendência não seremos capazes de compreender esta afirmação de Jesus.

C. S. Lewis no livro A última batalha das crônicas de Nárnia, fala de “um mundo dentro de outro mundo.” Jesus compara o reino de Deus ao fermento que desaparece no meio da massa ou a um tesouro perdido no campo. São realidades não visíveis numa realidade visível ou um mundo dentro de outro mundo. O autor de Hebreus também afirma que “não temos aqui cidade permanente, mas buscamos a que há de vir.”

Duas imagens nos ajudam a compreender melhor o sentido da súplica de Jesus: o peregrino e o turista (a primeira vez que ouvi estes arquétipos foi na aula de um professor). O tema do êxodo sempre foi uma realidade do povo de Deus. É deste contexto que surge a figura do peregrino ou estrangeiro. O peregrino ou o estrangeiro, tem a consciência do não pertencimento. O Egito nunca foi seu lar. Caminham em busca de seu verdadeiro lar. James Houston costuma dizer que a alegria “é a experiência de voltar para casa.” O apóstolo Paulo, escrevendo da prisão de Roma aos discípulos de Jesus em Filipos, os consola dizendo: “pois a nossa pátria está nos céus, de onde também aguardamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo…”.

Toda vez que oramos a oração que Jesus nos ensinou e dizemos: “Pai Nosso que estás nos céus…”, somos levados a reconhecer que nosso verdadeiro habitat, não é aqui. Somos peregrinos a caminho de nosso destino final. Em contraste, temos a figura do turista. O turista valoriza a viagem, não o destino. Enquanto o peregrino se vê vulnerável e sem um lugar seguro, o turista sempre se vê no controle de sua jornada. Se um determinado lugar não lhe agrada, faz as malas e procura outro. Se as pessoas que o acompanham não são agradáveis, ele procura novas companhias ou pode, se preferir, seguir sozinho. Enquanto o peregrino nunca pensa em voltar, o turista sempre volta. O peregrino aprende a confiar e a depender da providência divina, o turista confia no seu planejamento e nos recursos que reservou para sua viagem. O turista evita o conflito porque o prazer da viagem é o que importa. O peregrino enfrenta o conflito e os obstáculos porque o que importa é seguir em frente.

O arquétipo que melhor define o cristão é o peregrino. Jesus disse a Pilatos: “meu reino não é deste mundo” e na oração sacerdotal ele afirma em relação aos seus discípulos que eles também “não são do mundo”. Ao fazer esta afirmação, Jesus nos revela o lugar da transcendência na jornada do peregrino. Se este não é o meu mundo, sigo em direção à “Nova Jerusalém”, à “cidade que desce do céu”. 

Como você se vê em relação à sua fé hoje? Um turista ou um peregrino?