Páscoa: Da Morte para a vida com Cristo

Luiz Fernando dos Santos
8/4/2020
Espiritualidade

“Não tenham medo! Sei que vocês procuram Jesus, que foi crucificado. Ele não está aqui; ressuscitou, como tinha dito” (Mt 28.5,6).

A instituição da páscoa no Antigo Testamento se deu em um contexto de muito sofrimento. O sofrimento mais amplo era aquele da escravidão, dos nascituros masculinos assassinados, dos trabalhos forçados e a opressão da horrenda religião egípcia. O contexto mais próximo era o das pragas e de maneira especial, a última delas, quando a morte visitou as casas dos egípcios e ceifou os primogênitos de cada família, inclusive na casa do Faraó. Israel celebrou aquela passagem de Deus em meio a seu povo comendo pães sem fermento, de sandálias nos pés, cajado nas mãos, de prontidão para a saída e com o sangue de cordeiros sobre os umbrais de suas portas. Mais tarde, já no deserto, O Senhor deu instruções a Moisés de como o povo deveria relembrar e comemorar a sua passagem da escravidão para a liberdade e de como escaparam da morte por intervenção divina. O simbolismo da Ceia judaica tipificava em seus elementos os atos redentores em favor do povo: as ervas amargas, a salmoura, a pasta de cor marrom, o osso do cordeiro, o pão sem fermento, contavam a história do sofrimento e da redenção do povo pela iniciativa da maravilhosa graça de Deus. Jesus Cristo ressignificou o simbolismo desses elementos ao instituir a ‘Ceia do Senhor’, a verdadeira páscoa dos cristãos, quando celebrou a Nova e Eterna Aliança na última ceia com os seus discípulos. Não mais a escravidão, mas o pecado. Não mais o faraó, mas Satanás. Não mais o Egito, mas a morte. Não mais a degola de um cordeiro, mas o Seu sacrifício. Não mais o sangue de um animal irracional, mas o Seu precioso sangue e não mais o pão da pressa, mas o seu Corpo santo oferecido para matar a fome do mundo. De fato, “Ele É o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo!” (João 1:29) e ainda: “Pois Cristo, nosso Cordeiro pascal, foi sacrificado” (1 Coríntios 5:7). Esse ano vamos celebrar a Páscoa da Ressurreição com um duplo sentimento no coração. Exultando de alegria, cantaremos os ‘Aleluias da Vitória’, pois Cristo verdadeiramente voltou da morte: “Mas de fato Cristo ressuscitou dentre os mortos, sendo as primícias dentre aqueles que dormiram” (1 Coríntios 15:20) e devido ao contexto planetário da epidemia, faremos a mesma pergunta que as mulheres na manhã da ressurreição: “Quem removerá para nós a pedra da entrada do sepulcro?" (Mc 16.3). Será uma Páscoa de memória e desejo. Memória do estrondoso evento da ressurreição de Jesus Cristo e nela, a nossa vitória sobre a morte, e desejo de que a sombra da morte que hoje cobre o mundo seja removida, como aquela pedra no túmulo, e a fulgurante luz da vida raie outra vez sobre nós. Como no calendário litúrgico que celebra durante 50 dias o tempo pascal, até a festa de Pentecostes, também, esse ano, celebraremos a páscoa mais vezes. Será sempre páscoa quando um infectado gravíssimo receber alta. Será sempre páscoa quando um médico, um enfermeiro, um trabalhador essencial voltar para casa e com saúde. Será páscoa toda e cada empresa que sobreviver a essa crise e será páscoa quando cada emprego for preservado. Celebraremos as festas pascais quando políticas públicas socorrerem e protegerem os vulneráveis e quando as autoridades não politizarem a epidemia. Cantaremos o ‘Aleluia do Cristo Redivivo’ cada vez que a solidariedade vencer o egoísmo e cada vez que o amor ao próximo vencer o medo. Será páscoa quando cada lágrima for enxugada, cada coração partido for tratado e cada solidão for preenchida com gestos de fraternidade e humanidade. Esse ano, a páscoa não se esgotará não liturgia e mesmo aí, não será possível celebrá-la. Esse ano a páscoa será vivida na concretude da vida, em cada esperança renovada, em cada gesto transformador, em cada dom repartido em cada vida salva. Viveremos a páscoa quando os portões das escolas e universidades se abrirem sem perigo, quando os templos se encherem sem oferecer risco, quando os trabalhadores puderem sair de casa sem receios quanto ao futuro e seus empregadores estiverem seguros quanto ao presente. Viveremos a páscoa quando as medidas de proteção dessa ocasião e todo fomento desse momento se transformar em práticas do cotidiano. Enfim, saberemos que é páscoa quando todos tiverem vida e vida em abundância!

Feliz páscoa, para uma páscoa feliz!