A ressurreição e a esperança

Israel Mazzacorati
13/4/2021
Devocional

Jesus esteve com os discípulos por quarenta dias após a ressurreição. Lucas, em Atos, registra o testemunho deles como dias de ensino acerca do Reino de Deus, deixando viva em suas memórias a realidade da ressurreição (At 1.1-). Lucas também contou uma história sobre Jesus e dois discípulos no caminho para Emaús, em que o Cristo ressurreto lhes mostrou que a história bíblica como um todo apontava para a cruz e para a ressurreição como o seu cumprimento (Lc 24.13-35). Era na cruz e na ressurreição que a história estava sendo definida e algo totalmente novo e revolucionário estava acontecendo no tempo e no espaço.


Esse evento central na história da salvação, portanto, essencial da fé cristã, é a chave para a interpretação da vida. É como Paulo escreveu aos coríntios: E, se Cristo não ressuscitou, a fé que vocês têm é inútil, e vocês ainda estão em seus pecados (1Co 15.17 – NVT). Crer na ressurreição de Jesus Cristo significa, em primeiro lugar, habitar uma nova realidade em que impera a palavra divina: os seus pecados estão perdoados. Os que creem não estão mais mortos em seus pecados. Estão na vida de Deus. A ressurreição abre uma nova realidade, que é viver no poder da ressurreição: E, se o Espírito de Deus que ressuscitou Jesus dos mortos habita em vocês, o Deus que ressuscitou Cristo Jesus dos mortos dará vida a seu corpo mortal, por meio desse mesmo Espírito que habita em vocês (Rm 8.11 – NVT). Todavia, os que creem permanecem aqui, pisam este chão, respiram os ares da antiga ordem, em que uma história de vida é o que pode acontecer entre o nascer e o morrer. A morte encerrava toda história. 

Mas o que, de fato, mudou? Aqueles dois discípulos agora voltam para Jerusalém anunciando a ressurreição de Jesus. Essa mudança de direção responde à questão. O que mudou é que os seus olhos foram abertos e, finalmente, reconheceram Jesus. Com olhos abertos é que foram capazes de entender que aquele com quem conversavam era o Cristo ressurreto. E isso muda tudo. Agora, fazem o caminho inverso. Voltam imediatamente para Jerusalém como testemunhas da ressurreição: o desespero do início da narrativa é transformado em esperança que os impulsiona a pensar, decidir e agir com as lógicas da nova realidade: a ressurreição é real, a salvação é real, o perdão é real. Ele era mesmo o libertador, como eles pensavam (Lc 24.21), mas não eram capazes de dimensionar nem a libertação, tampouco o libertador. Agora, toda a compreensão da realidade precisará de ajustes, pois uma dimensão infinitamente mais ampla se abriu. A promessa se cumpriu. Deus nos resgatou!

Por isso, a ressurreição de Jesus exige de nós uma nova maneira de pensar, isto é, pensar para além dos limites outrora estabelecidos. Precisamos fazer o exercício reflexivo, diante da realidade transitória em que ainda vivemos e de suas contingências, o que significa viver o hoje sabendo que a morte foi vencida (1Co 15.54,55)? Que a morte, aquela fonte intocável de medo e angústia da humanidade, já não tem mais o poder de definir o destino (Hb 2.4,5)? Que o curso natural da vida natural foi alterado definitivamente (Jo 11.25,26)? 

Somente pela fé torna-se possível enxergar o que está para além da porta aberta pela ressurreição de Jesus. A realidade da ressurreição é o que nos dá um vislumbre da eternidade, da obra do Criador completa, da salvação definitiva, da felicidade plena. É a única possibilidade de ter uma visão de esperança sobre a transitoriedade de absolutamente tudo o que os nossos olhos já viram. A vida hoje é feita de experiências de beleza, assim como de profunda tristeza, mas nem uma e nem a outra constituem a realidade última. O que está por vir é a superação de tudo. Paulo fez o exercício de interpretar a sua realidade na perspectiva da ressurreição e da esperança que ela abriu: Portanto, não estamos desistindo. Como poderíamos? Ainda que por fora pareça que tudo está se acabando, por dentro, onde Deus está criando uma nova vida, não há um só dia em que sua graça reveladora não se manifeste. Os tempos difíceis nada são comparados com os bons tempos que estão por vir, a celebração sem fim preparada para nós. Há muito mais do que podemos ver. As coisas que agora vemos estão aqui hoje, mas desaparecerão amanhã. Mas as coisas que não vemos agora irão durar para sempre (2Co 4.16-18 - A Mensagem).